Deitada com a cabeça apensa na minha almofada


(...) apaguei a luz emanada do candeeiro sob a minha mesa de cabeceira, estendi as mãos e cobri o meu corpo. Cerrei o olhar. Instantes depois, o puxador da porta do meu leito oscilou lentamente e senti uma ténue brisa que se acomodou do meu lado. 

Nesse instante entendi. Há muito tempo que ela não se fazia notada e a sensação que possui é que a sua estadia ia ser demorada. Expressei o meu desagrado, mas ela não se mostrou importunada. Levantei-me, trajando o meu corpo com o robe de coloração marfim, observei o lado vazio do meu leito e em pensamento ordenei-lhe que ficasse justo ali. 

Depois, de pés desnudes e, com receio de despertar quem comigo priva, encaminhei-me para a chaise longue da minha sala e acomodei-me.  Rodando o rosto para o lado esquerdo consegui observar por entre a vidraça o céu imensamente azul e observei  a lua -  a sua magnificente rainha.

Sorri.

Tranquila e serena pensamentos tomaram de assalto o meu consciente. Nos últimos tempos,  tenho pensado muito. Pensado nas “gentes” que cruzam o meu caminho, aquelas que chegam e  permanecem trajando o lado esquerdo do meu peito – o coração – de amor e carinho.

As “gentes” que encurtam o meu choro, que diminuem o meu sofrimento, que abreviam a minha mágoa e tristeza nos dias ou noites de coloração nefasta e sombria. 

As "gentes" que dão colo, dão cumplicidade, dão conselhos, dão reprimendas, dão ternura, dão ombro, dão ouvido, dão abraço e, dão silêncio tantas vezes desejado e apetecido.

As “gentes” que comemoram comigo, se alegram por mim nos instantes e momentos de puro êxtase e alegria, onde as palavras e ações  ganham cor e vida, onde o olhar se detém em terna harmonia, onde o sorriso  embeleza o meu semblante  e se transforma em um gigante na minha vida. 

As “gentes”  que me aceitam da forma que sou, que me conhecem sem segredos, sem tabus, nua e crua. 

As “gentes” que respeitam o meu tempo e por vezes a minha ausência porque sabem o porquê. Pura e simplesmente sabem e sentem-me. São as “gentes” que se oferecem e doam gratuitamente pelo sentimento do bem querer e a quem a gente – eu - sente uma gratidão infinita.

Que lindas são essas gentes! E, quão reconhecida sou e estou por ter essas gentes na minha vida.

Inevitavelmente também penso nas outras “gentes”. As que apareceram, permaneceram mas que surpreendentemente, deliberadamente e gratuitamente com as suas ações e ou palavras proporcionaram o seu inesperado e abrupto desaparecimento da minha vida. Cerro o olhar, relembro a mágoa, o desconforto, a ilusão e o engano que nos dias de hoje, ainda, permanecem no lado esquerdo do meu peito. - o coração- e, confesso o dolo é irreparável. 

Elevo o rosto e  observo a noite lá fora. O céu transmutou-se numa tonalidade azul clara, detenho-me no relógio apenso no meu pulso e constato que o amanhecer está desabrochando, vagarosamente. A noite se desprende dos braços das estrelas e da lua e o dia está nascendo, vagarosamente. 

Sem pressa, levanto-me e encaminho-me ao meu leito. Observo o lugar vazio e, sinto que ela foi embora. Na ausência dela - insónia - o sono se acomoda.                                                    

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