Sem dó e sem piedade


(...) todos os anos na data assinalada do seu aniversário se renova mais intensa, mais dolosa e trajada de coloração negra e amarga. Primeiro, apodera-se dos meus sentidos depois da minha alma magoada aprisionando-me no torpor das horas, minutos e segundos do seu dia.

Com um pesar dilacerado, resguardo-me em pensamentos, instantes e momentos passados que não retornam mais.

Por longos instantes, cerro os olhos.

Debruço o meu rosto no seu colo e sinto o toque mágico da sua mão envelhecida mas macia nos meus longos cabelos encaracolados. Perscruto com atenção e oiço o meu nome enunciado como só ela pronunciava. Abro os olhos e observo longamente e pormenorizadamente o seu sorriso elegante que tanto a  caracterizava. Vagarosa e receosa elevo o braço e com a a mão trémula toco levemente o seu rosto que conheço de cor, repleto de rugas que o tempo intensificou mas cuja beleza não alterou, desprendo os meus lábios e sussurro palavras repletas de saudade, nostalgia, melancolia e em oposição de agradecimento, gratidão, reconhecimento, carinho e amor, muito amor. O amor que não tem carência nem ausência, não reduz com o tempo e que se mantém, genuíno, completo, intenso e vibrante no lado esquerdo do meu peito - o coração - mas que dói, dói demais ...

Anseio e recolho-me ao meu leito iluminado pela luz ténue que brota do imponente candeeiro, deito o meu corpo indefeso e repleto de dor na minha cama,  a cabeça extenuada na minha almofada de algodão branca, e permito que pela minha face geada e pálida  lágrimas brotem dos meus olhos e surjam veementes e desalinhadas. De lado,  pernas arqueadas à altura do meu peito fico prostrada  no delírio vivenciado e sem incertezas concluo que na minha vida existem prisões sem grades, sem correntes e sem algemas mas que aprisionam o meu corpo e alma dolente. 

Alguns minutos depois estendo o meu braço vagarosamente e pela pontinha dos meus dedos cerro a luz. A escuridão, é nesse instante, a minha única aliada.
Parabéns avozinha. Amo-te !

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