Na bancada da minha cozinha

.... descansa o recipiente translúcido onde abrigo os meus chás, aromas e, sabores, multifacetados que aprecio e, que invoco quando apetecido. Munida da minha xícara  desloquei-me para a minha sala. Abri a vidraça, observei o céu de coloração azul, senti a aragem forte e, escutei a vozearia de delicados passarinhos que se moviam irrequietamente de ramo em ramo pelas imponentes árvores do jardim apenso do lado, no reverso, ao silêncio perpetrado durante as noites admiradas.

Sinto-me extenuada e, fatigada.

A manhã espectável plácida transmuta-se num alvorecer densamente dotado de desassossego enovelada de algemas quiméricas acorrentadas de amarga fadiga convertendo-me numa debil refém. Sinto as horas a passarem e, a lassidão aferrolha-me com uma chave pesarosa a minha alma e, o meu corpo voluptuosamente. A paisagem traja-se por grades douradas.

Arrepio-me.

Usualmente, ser refém é um acto nefasto que ensombra, molda a essência e, transmuta-nos para uma opacidade. Sem apelo e, agravo as sequelas podem ser irremediáveis ou de difícil reparo. No entanto, o cativeiro pode ser sentido e, coabitado por delicadas algemas algodoeiras trajadas por acetinadas luminosidades que nos preenchem e, trajam sofisticadamente, requintadamente o corpo e, alma.

Por entre um gole e, outro do chá amornado, pondero e, medito na vivência da minha vida. Nos momentos que diariamente sinto-me refém de vastíssimos cativeiros. Os cativeiros que nomeio naturais dos sentimentos que acorrentam-me a alma nas afecções que concebem o meu dia-a-dia (receio, preocupação, ansiedade), outros que aprisionam-me o corpo (fadiga, dor). Outros, ainda, que se desnudam dos meus gostos peculiares que brilham e, caracterizam a mulher que sou e, que por vezes algo ou alguém anseia que molde e, transforme na mulher que desejava que fosse.

Expectante. Medito nos outros ... nos outros instantes em que apaixonadamente sinto-me delicadamente aprisionada pelos meus pensamentos, acções,  e, devaneios na presença dos que amo, amam-me e, sorridente enamorada permaneço cativa e, refém eternamente.

Refém, e, cativa são palavras que dolorosamente ou afavelmente mantêm-me reclusa no meu quotidiano.

Comentários

  1. Será que alguém, sabedor do seu gosto por chás e aromas, por sabores exóticos, invocou em seu nome, mandingou e a obrigou a cativeiros débeis e forçados, aniquilantes, acorrentadores e cerceadores de liberdade?
    ***
    Dizem que não há bruxas! Mas olhe à sua volta, que as há, que com rezas e chás mandingueiros fazem um ser, deixar de o ser, e virar um ser invivente, apenas amorfo.
    ***
    Tem que contratar outro "mandingueiro" de polo contrário, um desfazedor de pragas.
    ***
    Porque foi "praga", com certeza! Oh, e que reza!

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  2. Alá Ana
    Adorei o texto. A delicadeza de sua palavras , ao narrar os fatos encanta a todos nós.
    Bjux

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  3. Bailarina suas palavras são doces e quentes
    como um chá de alecrim...

    Tu bem sabes bailarina como está o seu coração!

    Sabe Ana...
    tenho um'caso'antigo com uma xícara de chá de camomila...rssss

    Beijinho de mim para si ♥

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  4. José,
    Surpresa pelo seu conhecimento do meu gosto peculiar por chás aromáticos o que permite-me concluir que é uma pessoa atenta e, observadora.

    Sabe?! Prefiro acreditar que são instantes que se revelam, naturalmente, passageiros ou prolongados.

    Um laço envolto em brisa de calmaria.

    Ana

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  5. Wanderley,
    As suas palavras, assemelham-se, a caracteres de aromas multifacetados de jasmim e, canela. Odores predilectos meus.

    Ana

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  6. Irlene,
    A sua presença encanta e, seduz o Ballet de Palavras nas palavras que emana.

    Um agradecimento e, um beijinho de mim para si.

    Ana

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